Diário de Coimbra, 7.jul.2013
Por favor, não me reduzam os casos dos hamburgers de carne de cavalo rotulados como de carne de vaca ou dos ultracongelados de peixe-caracol rotulados como de bacalhau a um caso de saúde pública (que não o terão sido), ou a um crime económico (que o serão) e menos ainda a uma mera “irregularidade” (sic). Estamos a um nível muito mais profundo, ao nível da fronteira última entre a verdade e a mentira, ao nível de um dos fundamentos éticos mais consistentes e estruturantes das sociedades humanas: a verdade. Um nível tão profundo que, noutro âmbito de reflexão, Bento XVI, na sua última encíclica, escreve sem meios-termos: para a Igreja, o serviço à verdade é irrenunciável.
O comércio, enquanto atividade, sem pôr em causa as pessoas, desviou-se daquele padrão de que “o cliente tem sempre razão”, para um descarado desrespeito pelo cliente: habituou-se a definir ele mesmo quais são as nossas necessidades, a vender-nos produtos de qualidade sofrível, a inflacionar os preços para tornar os saldos apetecíveis, a vender-nos “marcas” por produtos, a instrumentalizar publicitariamente tudo e todos, a levar-nos a assinar contratos de letra miudinha que ninguém lê, a obrigar-nos a comprar dois rolos de fita-cola quando só precisamos de um ou cinco adaptadores de tomadas elétricas para os diferentes países do mundo quando precisamos só de um para Inglaterra! E nós, enquanto consumidores, temos “engolido” tudo isto, com muita indiferença, alguma reclamação mais ou menos inconsequente aqui ou ali, e alguns impropérios descarregados no seio familiar para descarga da frustração quando chegamos das compras e nos apercebemos mais nitidamente de quanto não fomos respeitados. Nesta prática instalada, a rotulagem mentirosa é apenas mais um passo; mas há passos que correspondem a ruturas absolutas entre o sim e o não. A rotulagem enganosa é uma opção radical pela mentira, sem gradualidades ou atenuantes. Por isso, independentemente de contextos ou de consequências, deve ser também condenada em absoluto, sem gradualidades ou atenuantes.
A verdade não é utilitarista. Mas, dito isto, até do ponto de vista utilitarista o comércio só tem a ganhar com a verdade. Por motivos complexos, o comércio exagerou as capacidades consumistas das pessoas. Os centros comerciais e as grandes superfícies replicaram-se e multiplicaram-se, matando o pequeno comércio e matando-se umas às outras. Isto no momento em que a abertura dos mercados ao nível planetário provocou, pelo menos nesta fase, desequilíbrios também eles planetários. Acresce a crise social-financeira, com o comum dos cidadãos sem dinheiro para consumir. A situação tornou-se crítica: o comércio, quase todo ele, vive com a corda na garganta. Até dói entrarmos nalguns espaços comerciais e termos a sensação de que eles não fazem caixa no final do dia para pagar a luz. Pois bem, se a estes fatores somarmos clientes desconfiados de que estão a ser enganados por rótulos falsos…, o que esperam os comerciantes vender?! Os comerciantes precisam dos consumidores do seu lado; e isso só é possível se entre ambos houver relações de verdade.
O comércio, enquanto atividade, sem pôr em causa as pessoas, desviou-se daquele padrão de que “o cliente tem sempre razão”, para um descarado desrespeito pelo cliente: habituou-se a definir ele mesmo quais são as nossas necessidades, a vender-nos produtos de qualidade sofrível, a inflacionar os preços para tornar os saldos apetecíveis, a vender-nos “marcas” por produtos, a instrumentalizar publicitariamente tudo e todos, a levar-nos a assinar contratos de letra miudinha que ninguém lê, a obrigar-nos a comprar dois rolos de fita-cola quando só precisamos de um ou cinco adaptadores de tomadas elétricas para os diferentes países do mundo quando precisamos só de um para Inglaterra! E nós, enquanto consumidores, temos “engolido” tudo isto, com muita indiferença, alguma reclamação mais ou menos inconsequente aqui ou ali, e alguns impropérios descarregados no seio familiar para descarga da frustração quando chegamos das compras e nos apercebemos mais nitidamente de quanto não fomos respeitados. Nesta prática instalada, a rotulagem mentirosa é apenas mais um passo; mas há passos que correspondem a ruturas absolutas entre o sim e o não. A rotulagem enganosa é uma opção radical pela mentira, sem gradualidades ou atenuantes. Por isso, independentemente de contextos ou de consequências, deve ser também condenada em absoluto, sem gradualidades ou atenuantes.
A verdade não é utilitarista. Mas, dito isto, até do ponto de vista utilitarista o comércio só tem a ganhar com a verdade. Por motivos complexos, o comércio exagerou as capacidades consumistas das pessoas. Os centros comerciais e as grandes superfícies replicaram-se e multiplicaram-se, matando o pequeno comércio e matando-se umas às outras. Isto no momento em que a abertura dos mercados ao nível planetário provocou, pelo menos nesta fase, desequilíbrios também eles planetários. Acresce a crise social-financeira, com o comum dos cidadãos sem dinheiro para consumir. A situação tornou-se crítica: o comércio, quase todo ele, vive com a corda na garganta. Até dói entrarmos nalguns espaços comerciais e termos a sensação de que eles não fazem caixa no final do dia para pagar a luz. Pois bem, se a estes fatores somarmos clientes desconfiados de que estão a ser enganados por rótulos falsos…, o que esperam os comerciantes vender?! Os comerciantes precisam dos consumidores do seu lado; e isso só é possível se entre ambos houver relações de verdade.
Carlos Neves
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