domingo, 10 de junho de 2012

2012-jun-10
Ref.ª: 2.6
No “Dia das Comunidades”

No Dia das Comunidades (que a Pátria e Camões me perdoem a omissão), no mês em que a minha filha sairá para Inglaterra e no ano que se prevê ser o de maior emigração portuguesa em todos os tempos, falemos então de emigração.
O termo “comunidades” disfarça num rótulo sócio afetivo a dureza da experiência incarnada por 1/3 da população portuguesa. De relance, descubro-me como familiar, nalguns casos muito próximo, de portugueses que estão na França, na Suíça, no Canadá, nos Estados Unidos da América, na Venezuela, no Brasil, na Argentina … Como é gritante a ausência de um discurso coerente sobre a emigração num país onde todos temos o coração espartilhado pelo mundo! A Pátria (sempre a evoco!) ao menos deve-lhes duas palavras: uma de agradecimento pela honra de filhos, outra de pedido de perdão pela sua inoperacionalidade enquanto mãe.
Mas não são só os rótulos que mascaram a realidade. Hoje há duas novas máscaras: a ocultação estatística através de um mecanismo conceptual, dado que os portugueses residentes na União Europeia deixaram de ser considerados emigrantes; o reducionismo mediático à emigração de licenciados.
Quanto à saída de emigrantes, as conclusões até são fáceis: com ou sem estatística “oficial” (de facto, é para os países da União Europeia que sai a maioria dos portugueses), já se sabia – e o Secretário de Estado das Comunidades reafirmou-o vigorosamente há duas semanas – emigraram de Portugal nos últimos anos (pelo menos em 2011) entre 120 a 150 mil portugueses, o que faz com que 2011 tenha sido até ao momento o ano de maior emigração portuguesa! Maior do que em qualquer ano das décadas de 60 ou 70! E este ano, tudo aponta, a emigração ainda vai ser maior…
Por outro lado, a sublimação babada do “ai o meu filho está muito bem, é engenheiro na Holanda”, não apaga a violência da separação, a solidão de quem vai e de quem fica, a velhice desamparada, a instabilidade familiar, a sempre eterna saudade portuguesa, a falta do sol e dos cheiros a mato e maresia deste recanto do mundo. Mas, o pior de tudo, é que não é verdade: a maioria dos emigrantes viverá com menos pobreza do que em Portugal, mas continua a ser de portugueses pouco qualificados, mal remunerados, mais isolados que antes e, não raro, enganados, explorados e abandonados dos sistemas sociais.
Permita-se-me ainda, neste Dia das Comunidades e no ano em que a Obra Católica Portuguesa das Migrações comemora 50 anos, uma palavra de apreço pelo imenso trabalho desta Instituição, no passado e no presente, não só ao nível religioso, mas também, assumidamente, aos níveis do apoio social imediato, da denúncia e da intervenção política, tanto em Portugal como nos países de destino, nestes sobretudo através da vasta rede de capelanias que apoia.
Carlos Neves
Membro da Comissão Diocesana Justiça e Paz
(Publicado no Diário de Coimbra de 2012-jun-10)

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