domingo, 8 de janeiro de 2012

2012-jan.-08
Ref.ª: 2.6
A(s) Pessoa(s) e o Resto

Um dos paradoxos, com que se tece o mistério do homem, está no contraste entre aquilo em que acreditamos e como o vivemos, a nível pessoal e institucional. A maioria das atuais legislações garante a dignidade da pessoa como fundamento do ordenamento social. Contudo, a prática é bem diferente, mesmo que o primado da dignidade humana seja indiscutível, porque ela “é o bem mais precioso que o homem tem, graças ao qual transcende em valor todo o mundo material”, o que acarreta “a prioridade da ética sobre a técnica, o primado da pessoa sobre as coisas, a superioridade do espírito sobre a matéria.” (João Paulo II).
A primeira consequência é a centralidade da pessoa, uma de tantas expressões que a usura da rotina e o comodismo alienante vão mirrando no seu conteúdo substancial. Torna-se, por isso, importante recuperá-la e valorizá-la, especialmente, na sua concretização prática.

A nível individual, implica que cada um se assuma como protagonista, sujeito, livre e consciente, da construção de um futuro coletivo, sempre num diálogo dialético que respeite o princípio da subsidiariedade, segundo o qual cada um (pessoa ou grupo) deve assumir plenamente, na sua área de influência e de poder, aquilo e só aquilo que lhe compete. Assim não só se cimenta uma forte coesão social como nos enriquecemos com os talentos, únicos e irrepetíveis, característicos de cada cidadão.
A nível institucional, exige a criação e promoção de uma sã cidadania. Doutrinados para a estabilidade e o medo perante a mudança e o conflito (no sentido agónico) político, impostos Estado Novo, continuamos hoje em democracia reféns desses “brandos costumes”.
A maioria fica-se pela democracia formal (de votar/delegar); outros insistem na democracia participativa, para a qual pouquíssimos estarão preparados. Não só vivemos alegremente manietados pela partidocracia, conformados pela fatal rotatividade do poder e anestesiados pela crescente desconfiança em governantes incapazes de projetos mobilizadores, como somos mediaticamente formatados pelos mesmos debates, pelos mesmos opinadores e pelos mesmos argumentos, cegos para a criatividade e para a mudança.
É tempo de, sobretudo a escola, os média, as igrejas e movimentos cívicos, formarem para o bem comum numa nova dinâmica que valorize a criatividade e inovação, o pluralismo e abertura aos outros, e forme no hábito de pensar prospectivamente de modo a sermos construtores de um futuro que não seja mera repetição doentia do presente falido. 

José Dias
Membro da Comissão Diocesana Justiça e Paz
(Publicado no Diário de Coimbra de 2012-Janeiro-08)

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