domingo, 5 de fevereiro de 2012

2012-fev.-05
Ref.ª: 2.6
DEUS CRIOU / O HOMEM “DESCRIOU”

A primeira página da Bíblia é um poema da criação. O Génesis não apresenta uma história real, mas uma narração sagrada, em moldes populares e antropomórficos. Quer afirmar que Deus é o único Criador e o homem um ser criado e o responsável pela natureza criada. A criação acontece em seis dias, para assim realçar o descanso no sétimo dia.
No princípio, Deus criou os céus e a terra. Disse: faça-se a luz; haja firmamento; haja luzeiros; separem-se as águas da terra e sejam povoadas as águas e a terra. A seguir, disse: façamos o ser humano à nossa imagem e acrescentou: crescei, multiplicai-vos e dominai a terra! Ao olhar a obra criada, Deus viu que era muito boa e, no sétimo dia, repousou.
Hoje, o que podemos é narrar a “descriação” dos novos “deuses”.
Eles dizem: Haja separação das águas e da terra, e aconteceu. Os ricos unem-se e separam-se dos pobres: os ricos vivem em palácios; os pobres, na choupana ou debaixo da ponte. A seguir, decidem chamar seu ao que era dos outros. Mexem nos fundos de pensão, aumentam impostos, taxam pobres e reformados, reduzem salários, aumentam a precariedade laboral, dificultam o acesso aos bens essenciais. Criam as luminárias e, vestidos de luz e esplendor, pavoneiam-se pelos templos do poder. Vendo que isto era bom, dizem aos pobres multipliquem-se e povoem a nova terra, haja servos de mão-de-obra barata, sejam os subúrbios das cidades povoados de cidadãos sem pátria e sem direitos. Disseram ainda: façamos o capital à nossa imagem para que domine sobre os que rastejam na terra.
Por fim, não repousam no sétimo dia, enquanto os oprimidos amaldiçoam esta “descriação”, porque percebem que nunca mais terão descanso.
Agora é preciso recriar um novo paraíso onde todos se vejam respeitados na sua dignidade e direitos e ninguém tenha de se esconder e sentir nu como Adão e Eva depois do pecado; onde ser “deus” seja servir e não servir-se do povo; onde se vislumbre a libertação e a esperança com o corte da cabeça da exclusão.
O mundo é de todos e a todos Deus confiou o seu justo governo. Deus gravou na consciência do homem valores éticos, como a justiça, a paz, a verdade, a honestidade, a solidariedade… que hão de estar sempre na base de qualquer forma de governo. A voz da consciência é norma de conduta, que ninguém pode calar ou desvirtuar na gestão do bem comum.
A criação deu lugar à “descriação” e surgiu a confusão! Deus criou e viu que era bom. O homem “descriou” e vemos que é mau. Por isso, todos somos chamados a criar uma nova sociedade, com confiança e a esperança de em breve podermos ver que tudo é bom!

Alberto Lopes Gil
Membro da Comissão Diocesana Justiça e Paz
(Publicado no Diário de Coimbra de 2012-fevereiro-5)



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